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21 de nov. de 2010

CENTENÁRIO DE TIA MARIA













Maria da Conceição Carneiro é filha do segundo casamento de Juvêncio Alves Carneiro com Ana Bela Carneiro (Bilinha). Portanto, é irmã, por parte de pai, do nosso avô paterno Joaquim Alves Carneiro. É viúva de João Magalhães Cardoso.
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As Primaveras de Maria
Geane Oliveira Magalhães Azevedo*_ neta de tia Maria

Imaginemos uma travessia pelas águas que corriam na “Vereda”...
Era primavera de 1910, na Fazenda Alecrim. Imbuzeiros se penduravam em flor. Cajazeiras abrigavam o gado do sol forte. Palmas começavam a madurar os frutos. Enquanto as flores do sertão se abriam para abraçar a chegada de uma criança, pássaros anunciavam a cantoria de Antônio, Joaquim, Arquimimo, Francisca, Zezinho, Zeca, Ana Flora, Maria, João, Umbelino, Arlinda e Belarmino que estavam a alegrar a casa de Juvêncio e Ana Bela, com a doce cantiga:
Alecrim, alecrim dourado
Que nasceu no campo
Sem ser semeado...
De repente, a cantoria parou, e da porta da casa, Juvêncio anunciou: “É uma menina! É Maria!” Mas, Ana Bela complementou: “É Maria da Conceição Carneiro”. Os pais de Maria louvaram-na com este nome por certo, serem devotos de Nossa Senhora da Conceição.
Maria crescia em fortaleza e doçura. Era uma menina que aprendia com a mãe a ganhar força para a lida da casa: alvejar, cozinhar, peneirar, pilar, tecer, amar... Ela cuidava com muita ternura do seu irmão mais novo, o Prudenciano.
Com o tempo, o pai de Maria, Juvêncio Alves Carneiro, homem que fez nascer um povoado, uma capela, uma feira, uma cidade: Tanque Novo, na sua velhice precisou partir.
E a família continuou a crescer. A sua mãe, Ana Bela, casou-se novamente, e deu a Maria mais irmãos: Venício, Dalila e Celcina. Maria testemunhava cada nascimento, e cheia de graça, agradecia a Deus. Logo pensava: “Hei de estar sempre com eles.”
Enquanto isso, a menina aprendia em casa, a desatar o alfabeto e a experimentar o mundo da leitura, com um professor particular. Mas, a menina surpreendia a todos nos afazeres da casa, na lição do alfabeto e no poder de montaria.
A menina que já era moça, com seus encantos, conquistou um jovem, filho de Coronel. Era o João de sobrenome Cardoso, que morava em Mocambo dos Cardoso. Ao conhecer Maria, ele percebeu que a felicidade era para todo o sempre. E a união dos jovens foi na décima sexta primavera de Maria.
Com o passar das estações, eles construíram seu lar na Fazenda Alecrim. E, nas tardes, debruçada na janela, Maria contemplava o horizonte e assuntava o tempo. Conversava com os anjos do Senhor, através das orações que brotavam da alma. Ela pedia, com a certeza de ser atendida, pois, desejava uma criança. Então, o Senhor anunciou a chegada de um menino que já havia nascido e que perdera a mãe. João e Maria adotaram o menino, João Ledo, ensinando-lhe as leis da natureza, o respeito pelos milagres e o desvelo pelas coisas do céu. Depois desse filho, Maria conseguiu gerar no seu ventre: Osvaldo, Juvêncio, Aparecida, Ana, José, Leônidas, Olver, Maria e Zenaide. Logo, pai, mãe e filhos se amavam. O carinho dos olhares macios era o bastante para deixar os corações em comunhão.
A dor e a saudade não moravam na casa de Maria, até a ida de Joãozinho para São Paulo, sem volta e sem notícias. A família sofria em silêncio, mas, vencia a tempestade.
Outra surpresa viria aumentar a dor da família com a partida de João Cardoso. Logo depois, Maria percebeu que, aos poucos, o mundo foi perdendo as cores. Seus olhos não alcançavam mais as margens, sem a ajuda dos ouvidos, dos dedos e do coração.
Maria enfrentava o seu destino, ignorava o medo das tempestades; sabia que venceria essas passagens com a ajuda do Nosso Senhor. Desse modo, Maria aprendeu a ver com os ouvidos e, nas pontas dos dedos, foi escrevendo a sua história, na longa linha do tempo.
Ela não deixava de embalar a imaginação dos netos com as histórias orais, narradas pelos seus antepassados. Lembrava das fogueiras, na noite de São João, das novenas marianas, dos leilões, da cavalhada, dos Caretas, da Jaquelina, da tirada de argolinhas... Tudo isso é inesquecível para Maria que conta até hoje, sem perder o ritmo das palavras e, a cada conto, uma lembrança, uma emoção.
Hoje, pássaros e flores anunciam a primavera de 2010. E, com muita alegria, filhos, filhas, genros, noras, netos, netas, bisnetos, bisnetas, irmã, amigos e amigas vêm testemunhar as cem primaveras de Maria. Agora, só nos resta saudá-la com palmas calorosas, dizendo num só coro:
_ Viva os cem anos de Maria!

*GEANE OLIVEIRA MAGALHÃES AZEVEDO nasceu em Tanque Novo/BA, filha de Juvêncio Carneiro de Magalhães e Judith Oliveira Magalhães. Licenciou-se em Letras pela Universidade do Estado da Bahia – UNEB. É especialista em Literatura e Ensino de Literatura e em Leitura e Literatura Infanto-Juvenil pela UESB. E também em Plantas Ornamentais e Paisagismo pela Universidade Federal de Lavras – UFLA. Ministrou aulas no curso de pós-graduação, participou como Membro da Banca de Trabalhos Finais e como orientadora de Trabalhos Finais do Curso: Leitura (UESB). Ganhadora do I Prêmio Zélia Gattai Amado de Projetos de Leitura (1º lugar/categoria estadual) e II Prêmio Zélia Gattai Amado de Projetos de Leitura (2º lugar/categoria estadual). Presta consultoria em Leitura e Literatura às escolas pública e particular. Atualmente, além de ser contadora de histórias, exerce a profissão de paisagista e designer de interiores. Reside em Vitória da Conquista - Bahia.

Tia Maria:
Esse seu aniversário de cem anos é muito especial para nós tanque-novenses, porque, a senhora é a única remanescente dos filhos dos fundadores de Tanque Novo: Capitão Juvêncio Alves Carneiro e Capitão Prudenciano Alves Carneiro. É filha do primeiro e tem, ainda, o privilégio de ser neta do segundo.
Seu nome lembra o nome da mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo. Tal qual, é uma mulher guerreira, heroína, humilde, vitoriosa e de singular nobreza; destacando-se pela sua devoção ao Sagrado Coração de Jesus e ao Imaculado Coração de Maria. É mãe, avó e bisavó dedicada, além de ser uma cordial amiga.
Pedimos a Deus que continue derramando suas bênçãos e graças sobre a vida da senhora, dando-lhe saúde e paz. Pois, como disse Santo Agostinho, “mesmo que já tenha feito uma longa caminhada, há sempre um caminho a percorrer.”
Citando, também, Albert Einstein, “há duas maneiras de viver a vida: uma como se nada fosse milagre; e a outra, como se tudo fosse um milagre.” Portanto, seu centenário de vida representa um grande marco para a história de nossa cidade.
Parabéns e muitas felicidades! São os sinceros votos dos filhos e familiares de Arlindo Alves Carneiro e Raquel Pereira Carneiro.

A letra da música, a seguir, tem muito a ver com a história da tia Maria. É uma música antiga que já foi gravada por vários cantores. Uma das últimas regravações foi feita por Daniel:

                                        Meu Reino Encantado
                                                        Valdemar Reis/Vicente P. Machado

                                       Eu nasci num recanto feliz,

Bem distante da povoação.
Foi ali, que eu vivi muitos anos
Com papai,mamãe e os irmãos.
Nossa casa era uma casa grande,
Na encosta de um espigão.
Um cercado pra guardar os bezerros,
E, ao lado, um grande mangueirão.

No quintal, tinha um forno de lenha

E um pomar onde as aves cantavam;
Um coberto pra guardar o pilão
E a traia que papai usava.
De manhã, eu ia, no paiol,
Uma espiga de milho eu pegava.
Debulhava e jogava no chão;
Num instante as galinhas juntavam.

Nosso carro de boi conservado,

Quatro juntas de bois de primeira,
Quatro cangas, 16 canzis
Encostados no pé da figueira.
Todo sábado, eu ia na vila,
Fazer compra pra semana inteira.
O papai ia gritando com os bois,
E eu, na frente, abrindo as porteiras.

Nosso sítio que era pequeno,

Pelas grandes fazendas, cercado.
Precisamos vender a propriedade
Para um grande criador de gado.
E partimos pra cidade grande;
A saudade partiu do meu lado.
A lavoura virou colonião,
E acabou-se meu reino encantado.

Hoje, ali, só existem três coisas

Que o tempo ainda não deu fim:
A tapera velha desabada;
E a figueira acenando pra mim;
E por último, marcou saudade
De um tempo bom que já se foi;
Esquecido em baixo da figueira,
Nosso velho carro de boi.


Exceto a parte que diz: "Nosso sítio que era pequeno... Precisamos vender..." Pelo contrário, o pai de tia Maria, Juvêncio Alves Carneiro era dono de muitas terras. Outro detalhe: ela não foi embora para São Paulo; todavia, seu filho adotivo, Joãozinho foi e ficou mais de cinquenta anos sem dar notícias. Veja, acima, um recorte do jornal que fala sobre o reencontro dos dois ocorrido em 2007. Clique na figura para ampliá-la.

Tia Maria:

Cem anos de vida são dádivas divinas!